Duas ACs atrás, expus o que chamei de Dilema da Startup, denotando o fato óbvio de que o Mercado é quem molda a Economia - e portanto nossas vidas -, e que uma Startup tem duas opções de ação; duas hipóteses: (H1) reativa, atendendo necessidades de um segmento de clientes, ou (H2) proativa, criando necessidades e, por consequência, um novo nicho de Mercado. Daí surge o dilema, pois qual e quando escolher um determinado caminho. A H1, por ser reativa, leva na maioria dos casos à contemplação de serviços solicitados, o que resulta, geralmente, na criação de inovações incrementais. A H2, por ser proativa ao criar necessidades/desejos que os clientes nem sabiam que tinham, rompe o status quo e derruba o convencional, podendo gerar inovações radicais e até mesmo de ruptura. Ambas necessárias. A H1 é o feijão-com-arroz que mantém as empresas vivas. Ninguém consegue fazer um modelo de negócios preditivo que antecipe a disrupção. Entretanto, é a H2 que matará 70% das empresas que não a praticarem até 2030 e, o que não é surpresa, a chance de disrupções são maiores de brotar por quem pratica a inovação incremental diária e sistematicamente. Outro consenso: regiões do Brasil e do mundo propensas à disrupções são aquelas onde habitam ecossistemas de inovação consistentes; não vou exemplificar. E aí nasce o outro dilema: se o ecossistema é quem “conspira” para a promoção de inovação “raiz” no Mercado, na falta de um, quem deveria criá-lo? A resposta é óbvia, mas vou deixá-la no corpo do texto.
Conceito de ecossistema de inovação
Achei essa definição da Distrito massa:
“Sistema fomentado por diversos elementos que juntos criam um ambiente propício para o surgimento de novas ferramentas de inovação aberta. Entre os elementos mais comuns desse ecossistema estão instituições governamentais, universidades e empresas, mas que muitas vezes é complementada por hubs de inovação, incubadoras, parques tecnológicos e fundos de venture. Essa mistura cria um fluxo de sinergia em que todos envolvidos se beneficiam”. Do mesmo artigo, a consequência desse arranjo é que “Os ecossistemas de inovação estimulam a interação das empresas em diversos setores. Sobretudo, trata-se de um ambiente regado à transformação digital e fértil para o surgimento de novas ideias. (...) a partir de um ecossistema de inovação, é possível construir ambientes abertos e interconectados, favorecendo o compartilhamento de informações, dados, experiências e contribuir para o avanço de diversas áreas das empresas e startups”. Logo, o ecossistema de inovação é quem oxigena o Mercado. Sem ele, continuaremos respirando por um fio.
Inovação: conceito que a Universidade não compreendeu ainda.
Depois de 16 anos, junto a alguns desavisados idealistas, tentando criar um ecossistema por estas bandas potiguares, posso dizer com todas a letrinhas: estamos longe de ter um rascunho, o que não é segredo para ninguém, pois deixei muito claro numa AC há mais de 3 anos atrás, quando destaquei o texto abaixo e fui convidado a “bater um papo” nada amistoso na reitoria:
“Por que fazemos (Universidade) tanto barulho e ainda tentamos nos apropriar deste termo sem o devido conhecimento? Assim, quando um professor gabar-se por inovações implementadas em livros, oficinas etc., por seu LAB, pergunte: ‘onde, além do LAB, alguma “inovação” vossa foi implementada, validada ou o saber repassado?’. Não precisa ser rigoroso e exigir que tenha sido no Mercado. Você pode dizer ao incauto doutor que a validação de sua inovação em um outro laboratório já o satisfaria. Se ele proferir uma resposta negativa, diga que tem em mãos, no máximo, uma invenção, uma nova técnica ou um novo processo, os quais precisarão da chancela do Mercado para tornarem-se inovação. Peça educadamente, e em baixo tom, para ele ler o Manual de Oslo e ouvir o Mercado! Ou dê meu email!”. (GBB-San. Março/19)
Tem mais coisa lá naquela AC. E o pior, não mudou nada de lá para cá. Surgiram outras construções, firmaram-se muitos convênios, geraram-se muitas “patentes de retorno zero”, muitos standups ao invés de startups, hackathons etc. etc. etc., e nada de uma educação criadora, voltada à solução de problemas reais, aquela que precisamos de fato aprender. Resumindo, uma grande cortina de fumaça potiguar, que descrevi no conto Um pouco de Filosofia para entender o ecossistema de Natalino, no que chamei de “falar com as paredes”. Mas a culpa não é só da Academia nem das entidades representativas de classes da indústria (CNI, Federações, Sistema-S etc.). Vamos a outro elemento da famosa, e inexistente, tríplice hélice.
Por uma postura empreendedora “também” do Mercado!
Da AC de mesmo título, puxo a moral da história para começar: “Cabe à classe empresarial/comercial/industrial/etc., principalmente aquela que ‘mora’ no Mercado, tomar uma postura mais empreendedora. Será caro? Será! Será arriscado? Muito! Porém, garanto a vocês – e aos mais de 70% de empreendimentos que não chegarão a 2030 -, esperar pelos três caminhos (tríplice hélice, editais de fomento, educação convencional) ou fazer nada, sairá muito mais caro e de dano certo”. (GBB-San. Julho/21)
Iniciativas de empresas visionárias, na linha de formação de pessoal orientado ao Mercado, já estão rodando há algum tempo, as chamadas corporate universities, lá fora: Apple, Hamburger, Disney, Goolge e Defense Acquisition University, e aqui dentro: XP Academy, Positivo, Mercado Livre, CESAR School, para ficar nesses exemplos.
Então, se o apagão tecnológico e de desenvolvedores de negócios é uma dura realidade crescente, pois a capacidade de formação de nossas escolas é precária e insuficiente, Pelo que aguarda o nosso Mercado para se mexer nessa direção? Será que nossos empresários não são empreendedores?
Big picture
Esta AC não foi uma concepção auto-estimulada. É a consequência de inúmeras reuniões que tive a chance de participar com empreendedores de empresas de todos os tamanhos (pico, micro, médio, grande e extra-grande), sendo portanto a resposta à pergunta “Como está o ecossistema de inovação do RN?”, cuja resposta é outra pergunta: “Que ecossistema?”, seguida do complemento, “ainda não é um organismo, mas uma colcha de retalhos de aspirações inovadoras… algo totalmente desmembrado!”. “Mas se está assim, o que é necessário fazer?”, perguntam os incrédulos e inquietos. Então devolvo: “Montá-lo!”.
Resolvendo o outro dilema
Depois dos 50, aprendi que o caminho para a evolução começa pela autocrítica. Sempre me questiono: se não tenho o que elogiar em mim nesta semana, em relação à passada, é sinal de que não evoluí! Acho que o mesmo serve para organizações! Seguindo esta constatação, posso dizer que o caminho via hipótese H1, reativo - esperar que a Academia construa um ecossistema de inovação - já foi tentado e não está dando certo. Ela, a Academia, é imprescindível, pois detém estudantes ávidos e corpo com metodologia para promover invenções, que precisam ser melhor dirigidas, mas não tem brevê para conduzir seus pupilos e pesquisadores à inovação. Por outro lado, o Mercado, “diplomador” de inovações, não possui uma tradição de utilização do método científico, imprescindível num tempo em que a conversão da informação no novo petróleo força as empresas a serem um misto de fábrica e laboratório, definindo as melhores companhias como aquelas que desenvolvem seus próprios caminhos científicos, quando a busca se dá por vantagens disruptivas.
Se convênios institucionais, reuniões infinitas, eventos tripartite etc., não promoverão a ignição deste ecossistema, o que fazer então? Agir como fazem as formigas, ações efetivas, que criam grandes formigueiros, colando areia de grão em grão. Fácil falar, difícil de fazer. Mas se o que já foi tentado é moroso e pouco efetivo, dou uma dica: imaginem sensibilizar e juntar um grupo de empresas em um ambiente próprio, que reservarão recursos próprios para a promoção da inovação aberta, as quais chamassem gente responsável (não instituições) validada no Mercado (na área de inovação, claro), que apontarão mais gente boa ainda (estudantes, empreendedores, professores, interessados etc.) para compor squads dedicados à solução de problemas e criação de novos, ao mesmo tempo em que se capacitam onde devem - no Mercado -, tendo uma perspectiva de equilíbrio financeiro (breakeven) de médio-longo prazo, o que não nasceria disso? Em curto prazo, não sei se surgiriam empreendimentos disruptivos, mas, com certeza, pessoas com nova postura, prontas para tentarem novos desafios ou, no mínimo, serem adequadamente absorvidas pelo Mercado. Um ciclo virtuoso, né não?
Finalizando…
A hipótese H1, reativa, falhou. Resta a H2, proativa, de montar o ecossistema. E sabe quem é o principal cliente? Sim, o próprio Mercado! Resta pouco tempo e poucas opções. E aí, #VamosTestar?
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