Deixa eu começar com uma definição dada pelo Dicionário de Cambridge: “Uma maneira de trabalhar baseada em pessoas que têm empregos temporários ou fazem trabalhos do tipo freelancer, pagos separadamente, em vez de trabalhar para um empregador fixo. Os trabalhadores ganham a vida na gig economy fazendo biscates (foi a tradução que encontrei para odd jobs; fazer o quê?) sempre que podem”.
Segundo o IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, até maio de 2022 “aproximadamente 1,5 milhão de pessoas trabalham com transporte de passageiros e entrega de mercadorias”. No site da Cimento Itambé, os dados de junho de 2022 apontam 2,4 milhões de trabalhadores com carteira assinada na construção civil. Esse panorama em nível Pindorama (hoje tô cordelista) numa divisão simples, retrata que a gig economy (vou chamar de GE daqui para frente) emprega 63% do montante do ramo que mais emprega no Brasil. Acredito que a GE já flamule, por enquanto, em 2º lugar em termos de empregabilidade, e à medida que a tecnologia e a logística avançam - e o desejo de pedir tudo, ao invés de ir buscar -, o movimento manter-se-á aquecido e pulsando, dado que o número de entregadores cresceu 60% durante a pandemia e não dão sinal de diminuição, mesmo já tendo ela passado. E há algo engraçado em tudo isso. Como a GE caracteriza-se pela prevalência de contratos de curto prazo, agendamentos de última hora, comunicação massiva entre todos os envolvidos (que tem de ser eficiente e em tempo real) e o cliente que transformou-se em multilaterais (entregadores, lojistas e consumidores finais), conforme mostrado na AC Business Hyper Canvas, tudo só pode acontecer graças à automatização orquestrada por algoritmos, de modo que a confiança e efetividade das transações passou a ser creditada mais a (senão unicamente) plataformas do que pessoas. Como resultado, gerou-se uma horizontalidade de baixa estratificação hierárquica na qual os gestores da GE (contratantes, canceladores, avaliadores etc., um RH digital de fato) passaram a ser… robôs! Se Adam Smith, em seu livro “A Riqueza das Nações” (1776), sugeriu que o mercado livre se autorregularia sem a necessidade da intervenção do Estado, mas por obra de uma “mão invisível”. Posso pegar o mote e brincar (ou não) dizendo que a cabeça também ficou translúcida. Talvez seja essa a nova face da Gig Economy: uma Economia Senciente!
Falamos de mãos e cabeças invisíveis, gerentes IA, logística algoritmizada e contratos temporários para atender necessidades dinâmicas de clientes (haja consumo!). E se ainda num futuro próximo pudermos acrescentar veículos autônomos (carros, drones etc.) e fábricas ultra-automatizadas, não seria exagero de minha parte elucubrar sobre um novo conceito para a palavra “Mercado”. Sendo assim, vou adicionar minha outrora epifania…
Convergências
Quando falo em “Convergência Tecnológica”, poderia substituí-la pelo elemento que está conectando tudo e todos: o celular. Refiro-me à utilização de uma única estrutura artificial com capacidade para concentrar a maior quantidade de serviços importantes para uma pessoa em todos os tempos. Em uma AC passada, Hipótese da Máxima Inclusão Social ou HMIS, cogitei que “no limite em que a tecnologia tende ao infinito – torna-se ubíqua e pervasivamente disponível -, o Mercado tende a abarcar toda a Sociedade; por consequência, qualquer cliente, por inclusão, passa à categoria de cidadão. Mercado e Sociedade tornam-se sinônimos. Cliente e cidadão passam a ser indistinguíveis. Quem não estiver no Mercado, não estará na Sociedade”, e sugeri um elemento para isso, denominando-o por Celular da Inclusão, ou Cinc. Pense então no Cinc como um dispositivo dedicado concentrador de serviços. Ele conteria, por exemplo, instruções em formato de vídeos curtos sobre higiene pessoal, educação cidadã e empreendedora, pontos de acolhimento (albergues, serviços de saúde, locais de alimentação, nutrição, preço de cestas básicas etc.) e o fundamental: aulas sobre microcrédito. Um celular com esta capacidade poderia tornar viável uma outra convergência, a Social-Mercadológica. Ok, GBB-San, filósofo social de fim de tarde, qual a relação disso com a GE? Vamos então para outro elemento: indicadores.
Um pequeno experimento: os indicadores da GE.
As Big Techs mapearam e mapeiam, respectivamente, geográfica e demograficamente todo o globo. Não acreditam? semana passada (06/08/22) instalei o Google Analytics™ no site de meu livro, para começar a aprender “umas coisinhas”. Uma semana e 500 visualizações depois, descobri até a cor do botão que as pessoas gostam mais de clicar, já que coloquei a mesma informação em botões diferentes. Sei de onde são, quanto tempo passaram em cada página, se voltaram, quais ACs leram, quem fez download, e mais um bocado de coisas que ainda estou aprendendo. Fiz um outro teste também. Pedi para meu filho entrar (via celular dele) no site. Assustador: vi clicks a mais quase em tempo real. Não perguntei nada a qualquer vivente. Se eu solicitar - via página, claro -, acredito que possa coletar ainda mais informações. A implantação dessa ferramenta em meu site, cujo assinatura é de R$ 14,00/mês, está custando “zero mil reais”. Ou seja, aparentemente “grátis”! Claro que não existe café de graça na cozinha do mundo empreendedor. O Google tem interesse que eu venda e que outros comprem, pois é dessas transações que ele minera recursos. Logo, ele será meu sócio em cada livro a ser vendido.
O que eu quero provar com este experimento? Que pode-se saber exatamente a necessidade não atendida de cada cliente que utilize qualquer dispositivo ligado à rede. Acredito também que isso pode se dar em tempo real a um custo perto de zero. Em outras palavras, a Economia está toda rastreada, não importa o status social ou a cor de seus belos olhos.
Não adianta se esconder. “Eles” sabem o que vocês fizeram no click passado!
A Economia senciente: um ser que sente
Juntarei tudo agora, de modo que faça sentido o final deste filme. A Gig Economy chega onde existir um celular. Em 2021 éramos 109 milhões de pessoas portando smartphone. Admita que um Governo bondoso entenda que distribuir um Cinc (o celular da convergência sócio-mercadológica) seja uma boa, do ponto de vista da governabilidade, IDH etc., pautado naquelas letrinhas que a ONU quer ver implementadas, as ESG. Pronto: todo mundo na Gig! Agora dá para saber onde todos estão e o que precisam. Dá até para levantar um mapa de necessidades em tempo real, e com ele prever fornecimento, logística, tendências etc.
Olhando apenas questões comerciais, as coisas poderiam ser resolvidas para todas as classes. Imagina o Cinc de um cidadão/cliente solicitando uma cesta básica. Automaticamente, a malha da Gig sinalizaria para alguém, ou para um gestor-robô, tal evento, e um motoboy, motogirl, carro ou drone autônomo receberia um smart contract para dirigir-se a um fornecedor, contratado nos mesmos moldes, para resgatar a encomenda e disponibilizá-la ao cidadão/cliente, tudo rastreado e com validadores ao final da operação. Se fosse um cliente em condições econômicas regulares, a coisa dar-se-ia como no convencional. Se fosse para um cliente em vulnerabilidade, o pagante seria o governo. Ao final, todas seriam transações normais, com pagantes, fornecedores, distribuidores e recebedores, podendo coincidir o pagante com o recebedor. Massa, né não?
Mapa de necessidades em tempo real. Uma Economia Senciente poderia aprimorar o poder do Estado? O resultado seria fantástico.
Serendipiando…
Agora posso soltar a epifania: uma Economia Senciente poderia levar a um Mercado autônomo! “A mão e a cabeça invisíveis do Mercado”, uma teoria de Adam e GBB-San! Achei bonito…. Aterrissando, o que isso quer dizer? Do ponto de vista social, contemplaríamos, pelo menos, umas das necessidades básicas de Maslow, a de alimentação, e agora estaríamos prontos para escalar a pirâmide! Parece utópico. Porém, segundo Albert Einstein, “Se a sua ideia não é absurda, não há esperança para ela!”. Estou, portanto, bem encaminhado!
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